Por isto o Apocalipse é sempre um livro para a experiência existencial da fé, posto que de pouco ele adiante se a percepção dele não estiver revestida de fé.
Depois de estudar o livro durante muitos anos, e, além disso, feito diversas exposições nele, nunca antes havia me disposto a escrever algo a respeito, exceto um texto aqui e outro ali.
Apesar de ter vivido bastante fixado e atento à existência a partir do Apocalipse, na realidade nunca me animei a escrever sobre ele em razão de que nunca cri que fosse possível haver uma interpretação prévia e definitiva do livro, mas tão somente a possibilidade de se ir lendo o livro no processo histórico.
Assim, para mim, é sempre cedo para se escrever qualquer coisa sobre o Livro da Revelação.
Isto porque não creio que o Apocalipse seja aberto a qualquer forma de interpretação tópica antecipada de nada.
De fato, o livro do Apocalipse é a História como Profecia e a Profecia como História. Porém, tal discernimento acerca do significado do livro, não apenas será sempre parcial até que chegue a última geração de humanos (a primeira a poder ver o Apocalipse em sua totalidade), como também seu estudo somente fará sentido hoje a partir de uma visão de fé, do contrário, não há porque se estudar ou buscar entender o que quer que seja acerca do Apocalipse.
Portanto, do ponto de vista fenomenológico, a História é a hermenêutica processual do Apocalipse.
Isto porque o que nele se tem é o desenvolvimento crescente do volume acumulado de cumprimentos relativos aos muitos apocalipses generacionais no curso da História humana.
Assim, geração após geração, a profecia de João cresce. E isto simplesmente porque o Apocalipse só é passível de interpretação no crescimento do processo histórico-existencial-coletivo — visto que é na expectação existencial e no derrame de percepções inconscientes e coletivas que o Apocalipse provoca em nós, que se pode vir a olhar a História com olhar adequado ao crescimento de sua lenta interpretação no tempo e no espaço.
Assim, o Apocalipse quase nunca é percebido antes, ou sequer no momento em que esteja acontecendo, mas logo depois, ou até bem depois — que é quando se vê que o Apocalipse fez seus ensaios entre nós e nós nem mesmo percebemos.
Creio que assim como o apostolo João disse que havia muitos anticristos em seus dias, embora ele mesmo cresse (à semelhança de todos os demais Apóstolos e de Paulo) na existência de um Homem da Iniqüidade, um Anti-Cristo — do mesmo modo creio que há muitos apocalipses, embora ainda venha o tempo em que o que hoje é misterioso sobre o livro do Apocalipse de João, será tão obvio que parecerá ridículo que antes não se tivesse entendido o livro. Assim será quando o Apocalipse se consumar como processo histórico.
Por isto, digo o obvio antecipadamente:
O Apocalipse é a Interpretação Macro Fenomenológico da História; na mesma medida em que a História é a Chave Crescente e Atualizante da Interpretação do Apocalipse.
Além disso, também não creio que qualquer exposição do Apocalipse possa ser qualquer coisa senão opinião pessoal, pois, pela sua própria natureza, o livro não está aberto (visto que a História não está concluída); por isto sendo apenas passível de ser objeto de fé em qualquer que seja a tentativa interpretativa.
Pode haver “ciência” no estudo da literatura apocalíptica ou escatológica. No entanto, o livro chamado Apocalipse é mais que literatura apocalíptica, evocando para si um papel consumatório no sentido da História e da Trans-História. Assim, ele é literatura de natureza apocalíptica, fazendo parte de um grande elenco de textos de estilo semelhante de mensagem indicativa de um sentido escatológico, ou, futuro, acerca dos processos históricos, porém, dotado de um sentido e de uma ordem de coisas, que, o fez ser incluído entre os livros considerados inspirados ou canônicos.
Por isto é que a fim de entrar com coragem no Apocalipse, deixando os ecos e as repetições sem fim das mesmas antigas linhas e correntes de interpretação, tenho que fazê-lo pela fé, pois, para além da fé, toda tentativa técnica de entender o Apocalipse é presunção de uma ciência que simplesmente não existe como tal.
Ora, a existir uma ciência a pretender buscar sentidos mínimos sobre o livro do Apocalipse, ela deveria ser um composer de História, Psicologia Junguiana, Antropologia, Sociologia, Física Quântica, Teologia, Literatura e, sobretudo, os informes do dia. Com tais instrumentos em mãos o livro começa a ser mais bem entendido, mas, mesmo assim, está longe de ser ainda discernido.
Coerentemente com o espírito do Apocalipse somente pela fé pode-se expressar qualquer que seja a interpretação do Apocalipse, pois, sem que seja apenas fé, qualquer outra tentativa é “mexer no livro”, pela presunção de objetivamente oferecer aos demais um leitura certa da profecia de João, que é colocar-se sobre as pragas do próprio livro.
Desse modo, qualquer interpretação do Apocalipse deve ser apenas uma obra pessoal de fé; e não deve ser vista jamais como qualquer outra coisa.
“Mexer” no Apocalipse, que é o que o livro recomenda que jamais se faça, mais do que criar uma “paráfrase” é criar uma sistemática de presumida absolutização interpretativa.
Ora, digo conscientemente que qualquer interpretação do Apocalipse tem que acontecer “pela fé”, pois, conquanto a fé seja “certeza de coisas e fatos”, todavia, a própria revelação do Apocalipse nos diz que a única certeza no Apocalipse é a de que Tudo Está feito, e que assim será. Mas, além disso, não se diz que alguém, antes da Hora, poderá saber qualquer coisa com certezas que sejam vinculadas às predições contidas no livro.
Por isto o livro manda que sobre ele mesmo o entendido continue a buscar entendimento.
Creio que conheço praticamente todas as escolas de interpretação do livro do Apocalipse, das discussões dos chamados “Pais da Igreja” acerca do livro, às inúmeras escolas de interpretações clássicas do texto, e até mesmo as mais esotéricas, psicológicas, psicodélicas ou bizarras, como a do psicopata Charles Manson.
Também sou bem afeito no conhecimento às varias propostas de divisão pedagógica ou estrutural do livro, e vejo que não há consenso entre nenhuma delas, fazendo com que cada divisão não passe de gosto pessoal do autor da proposta, o qual veio a ser adotado como “doutrina” por pessoas menos dadas ao esforço de ler e discernir por si mesmas.
Hoje em dia qualquer entrada na Internet oferece ao leitor centenas e milhares de textos sobre tais discussões.
Assim, como não tenho nenhuma vocação para demonstrações de conhecimento estéril (ou de qualquer outra natureza, especialmente porque as “informações técnicas” sobre o Apocalipse estão disponíveis a qualquer pessoa, não apenas em livros, mas, sobretudo, através dos milhares de textos, artigos e materiais acerca do tema na web) — jamais escreverei sobre o Apocalipse fazendo repetições comuns nos livros do gênero.
Lendo o Apocalipse você verá que somente é possível alguma certeza sobre o livro, se você decidir pela fé quais sejam os eruditos que possam estar mais embasados em sua teoria.
Os que rejeitam a autoria do Apostolo João alegam basicamente duas coisas:
1. Que o texto grego do Apocalipse não se parece com o texto grego do Evangelho de João. Portanto, seriam autores diferentes.
2. Que alguns “Pais da Igreja” não consideraram o livro como sendo da autoria de João, já na passagem do 2º para o 3º século; e, portanto, em razão da proximidade histórica, tal negação possivelmente invalidasse a autoria de João, o Apostolo; posto que se o livro fosse de João, o autor do Evangelho, alguns “Pais” não o descartariam.
Pessoalmente creio que o 1º argumento é tão tolo quanto expor muitos textos meus a tais critérios, e, depois, verificar que no curso dos anos meu estilo e modo de escrever mudaram tanto, que, séculos depois, possivelmente alguém dissesse que os Caios dos textos não eram a mesma pessoa.
Além disso, também creio que o Evangelho foi possivelmente escrito por um secretario, enquanto o texto do Apocalipse pode ter procedido da pena do velho e solitário João, sem a ajuda de redação que o texto do Evangelho de João recebeu. Daí o grego do Apocalipse ser tão inferior ao do Evangelho, além de conter erros gramaticais considerados significativos.
Quanto à rejeição de alguns “Pais da Igreja”, o que creio, quando se olha o período histórico, é que tanto havia um surto apocalíptico perigoso, alienante e suicida, sem falar nos exageros adventistas da época, como também havia um verificável desejo de alguns “Pais” de esvaziar a interpretação apocalíptica de seus riscos de provocação política, como havia acontecido já em anos anteriores, com conseqüências consideradas posteriormente desastrosas.
Nele, que nos chamou para esta Hora,
Caio
10 de março de 2009
Lago Norte
Brasília
DF
Brasil